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El Mítico Benfica | #39 | No conforto da mediocridade (PT)

Muita gente escreveu que as eleições de 25 de outubro de 2025 foram um banho de realidade. Não concordo. Foram um tsunami. Daqueles mesmo à filme, em que até os ossos ficam molhados e o corpo é arremessado contra os destroços que surgem de forma aleatória no nosso caminho. Num evento altamente participado - mais de 85 mil almas é obra - os sócios do Benfica deram a vitória a Rui Costa, com alguma margem, mas não o suficiente para a maioria absoluta. Como escrevi e disse várias vezes, as sondagens que iam saindo não deviam ser tidas em linha de conta: o universo benfiquista é tão amplo e abrangente, em Portugal e no estrangeiro, que as eleições de 2025 seriam a verdadeira sondagem, desenhando um retrato muito aproximado da percepção dos benfiquistas. Rui Costa e João Noronha Lopes passaram, deste modo, à segunda volta.
Antes de tentar justificar os resultados, importa perceber como se chegou até aqui: a direção vigente tem trabalhado com bastante afinco na sua reeleição, apostando num ato de fé - não se preocupem, benfiquistas, depois de 5 treinadores em 4 anos agora é que vai ser. Esperou-se que a bola entrasse para amenizar o descontentamento crescente: perdemos a Liga, a Taça de Portugal (uma vergonha), ganhando a Taça da Liga em janeiro. É muito pouco para um clube como o nosso: para a nossa história e ADN; para os investimentos avultados na equipa de futebol (e nas modalidades), que resultaram num parco retorno desportivo. Mas Rui Costa, que no tempo de Vieira foi usado como um escudo de benfiquismo e percecionado pelos benfiquistas como uma figura intocável, chegando a um ponto em que os sócios não equacionavam um Benfica sem o seu príncipe perfeito, foi-se mantendo acima de qualquer suspeita. Vieira, que lançou duras críticas ao seu delfim nos últimos meses, por muitas razões que tenha, também foi ingrato: se Vieira subsistiu tanto tempo no Benfica, deve-o, e muito, a Rui Costa. E o Rui não se importou de assumir esse papel. Não é que Rui Costa tenha trabalhado particularmente bem ou muito; foi pelo simples facto de ser Rui Costa. Um antigo jogador extraordinário, mas que como dirigente não tem sido mais do que uma desilusão. O plano era simples: esperar que a bola entrasse e manter-se em silêncio. Não levantar ondas. Não destacar o que foi o seu mandato, até porque se isso acontecesse, pelo menos num país decente, nem se devia recandidatar: um campeonato em 4 anos, zero taças de Portugal, 2 supertaças e 1 taça da liga; o passivo aumentou e perdemos 15 milhões ao ano; não somos respeitados institucionalmente; e, o pior de tudo, o clube perde, a olhos vistos, a sua exigência e mística. Perder é visto com naturalidade - uma perversão do que foi preconizado em 1904.
Quanto a Noronha Lopes, repete a sua candidatura. Em 2020 foi um raio de luz; em 2025 apareceu com força, mas não há uma segunda oportunidade para causar uma primeira boa impressão. Fiquei sempre com a sensação de que teve muita dificuldade em sair do seu universo, em que contava e conta com um apoio entusiasta e significativo, mas não o suficiente para ganhar eleições. Cometeu alguns erros: a conversa sobre Bernardo Silva ou a possibilidade de Ruben Amorim, seguida de uma viagem a Manchester, deram a sensação de desespero e de recorrer a práticas eleitoralistas em desuso. Além disso, deu-se demasiado crédito às sondagens que o davam à frente - até se falava da sua vitória à primeira volta. A realidade contou uma história diferente. Não é um comunicador brilhante, nem tinha de o ser. Mas tardou a encontrar um registo presidenciável e combativo. Creio que melhorou muito, especialmente na última semana: resta saber se será o suficiente para ganhar. Aqui entra o papel do jornalismo português que, através das eleições no Benfica, exibiu o estado de absoluta indigência em que se encontra: salvo honrosas exceções, preferiu ser o veículo transmissor de 2 candidaturas (Vieira e Costa), do que se preocupou em fazer o seu trabalho. Não tenho memória de umas eleições em que os candidatos da oposição tenham sido (muitíssimo) mais escrutinados do que o candidato e presidente em exercício. Aqui, Noronha foi uma vítima de uma campanha mentirosa: dos seus alegados negócios ruinosos (mentira) à menorização do seu papel em 2003 (uma injustiça), até à comparação com Vale e Azevedo (uma aberração). Neste caso, o papel de Luís Bernardo foi fundamental: é um homem muito bom no que faz, recorrendo à desinformação com mestria. Nos dias que correm, mais do que a realidade dos factos é a perceção que se cria da realidade que importa - uma mentira repetida 1000 vezes, tanto no tempo dos nazis como hoje, passa a ser verdade. No Benfica pululam mentes totalitárias, com práticas totalitárias: chamar os outros de tachistas, abutres e oportunistas é bastante revelador. Normalmente, estas mentes totalitárias acusam os outros daquilo que eles são. Mal, tal como no Teatro, a luz incide sobre o queremos que seja visto, quando é na sombra que acontecem as coisas importantes.
Importa referir, uma vez mais, a importância dos projetos benfiquistas, como os podcasts ou a própria BTV - ficamos mais esclarecidos com intervenções nestes espaços do que na imprensa. O debate entre Costa e Noronha, promovido por diferentes órgãos de comunicação social, foi (mais uma) oportunidade perdida: zero sobre o futuro do Benfica. Só se preocupavam com telefonemas entre os candidatos e as possíveis transferências de votos entre candidaturas, como se os votos dos benfiquistas fossem cromos; ou dando um destaque desproporcionado a Mário Branco, que agora atingiu o nível do melhor desportivo da história da Humanidade e de intocável para José Mourinho, sendo que qualquer apreciação em relação a Branco era visto como um ataque ao Benfica. O mundo de pernas para o ar.
Deste modo, o debate de ontem, a dois, na BTV, ganhou uma importância acrescida. Foi um debate mauzinho, com demasiados apartes e gritaria, em que a figura que mais se destacou foi o moderador - um belo jornalista. Noronha não começou da melhor forma, mas com o tempo encontrou o seu registo: a partir de certa altura, não se limitou ao ataque, apresentado também a forma como faria as coisas. A escolher um vencedor, só poderia ser Noronha Lopes: sim, foi agressivo, sim, passou das marcas de vez em quando, mas tendo em conta a desvantagem em relação a Costa, não tinha grande alternativa. Costa esteve mais perdido do que noutras ocasiões, porque, apesar de bem preparado ao nível do soundbite e dos “momentos mediáticos”, patinou quando (finalmente) Noronha colocou os dedos na ferida. Mas só a 8 de novembro poderemos confirmar se este debate teve influência no resultado final.
Tal como referi anteriormente, em outubro votei em João Diogo Manteigas. Mas que se Noronha Lopes passasse à segunda volta perante um candidato da continuidade, votaria em Noronha, sem qualquer hesitação. Não é um voto contra ninguém. O voto em Noronha não é um voto contra a pessoa e jogador Rui Costa, mas sim contra a sua (falta de) liderança. Contra a sua gestão e a forma de ver o clube - um digno sucessor de Vieira que, tal como o seu antecessor, está ultrapassado. Todavia, continua a achar que faz tudo bem e não aprende com os erros.
Ele não está no clube há quatro anos - também teve responsabilidades no clube antes disso e durante muito tempo. São mais de 20 anos (Vieirismo) a gerir e a pensar da mesma forma, sem aprender com os erros. Obviamente que é difícil criar e pensar em algo novo depois de tanto tempo à frente de uma instituição como o Benfica - e parece-me que não há grande vontade em fazê-lo.
Voto em Noronha Lopes porque é preciso um Benfica diferente. Que faça jus ao seu legado. O nosso desígnio não é bater records de vendas ou congratular-se com relatórios financeiros. O nosso desígnio é ganhar.
Comparem os programas de Rui Costa (é insultuoso na dimensão e na falta de propostas - 16 páginas que também podiam ser um conjunto de post-its) e de Noronha. Comparem as equipas. Pensem nas promessas de 2021 e no que está feito em 2025. É comparar a Estrada da Beira com a beira da estrada.
Voto num Benfica que não tem medo de ser feliz. Que não fique impávido quando gasta mais que os seus rivais e depois ganha menos (no futebol e nas modalidades). Voto no Benfica que não se sente cómodo na mediocridade. O Benfica é paixão, mas em alturas como esta temos de decidir em função da razão, para que possamos continuar a ter um clube que mereça a nossa paixão.
É possível ter um Benfica melhor. Um Benfica que não tenho medo de si próprio.
Têm a palavra os sócios. Não deixemos fugir esta oportunidade de mudar. É hora de colocar o Benfica acima de tudo.
A 9 de novembro, continuaremos por cá. Atentos, apaixonados e diligentes.
Viva o Benfica!